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Manejo de dejetos e oportunidades
Por Willian Rufino de Andrade*
Por Redação Portal na Hora
Publicado em 07/10/2025 15:48
Economia
Dejetos bovinos: de problema ambiental a oportunidade econômica (Divulgação)

A geração de dejetos é uma realidade inevitável na pecuária. Para dimensionar o desafio, um único bovino pode produzir mais de 18 kg de dejetos por dia, ultrapassando 6,4 toneladas por ano. Quando não há manejo adequado, esse volume se torna um problema: transmite doenças, causa mau cheiro, polui o solo, a água e até o ar.

Mas olhar para os dejetos apenas como um passivo ambiental é deixar escapar uma oportunidade valiosa. Um rebanho de 100 animais, por exemplo, pode gerar nutrientes equivalentes a uma pequena fortuna em fertilizantes: 3.100 kg de Nitrogênio (N), 2.000 kg de Fósforo (P) e 6.200 kg de Potássio (K) ao ano. Isso, na prática, significa menos gasto com adubação e mais energia disponível dentro da própria fazenda.

Com o manejo correto, o que antes era problema vira economia e, em alguns casos, nova fonte de receita para o produtor rural.
Como aproveitar os dejetos - O sucesso no aproveitamento começa pela coleta do resíduo, que pode ser líquida, pastosa ou sólida. A dieta do animal e o sistema de produção influenciam muito na forma física do material, o que, portanto, determina o melhor método de transporte e tratamento para transformar dejetos em fertilizantes ou energia. Compostagem, o pontapé inicial - Para quem busca uma solução simples e econômica, a compostagem é um excelente começo e primeiro passo.

O processo se baseia em misturar o dejeto com materiais secos, como palha ou serragem, formando pilhas de compostagem. As pilhas, com cerca de 1,5 metro de altura e largura, devem ser revoltas sempre que necessário, para correção e ajustes de umidade, que deve ser mantida próxima de 60%, e temperatura, entre 50 e 80°C. Em um processo bem conduzido é possível obter uma redução de 50% de gases de efeito estufa e, em 60 a 90 dias, o material se transforma em um composto orgânico mineralizado de alta qualidade.

Esse método pode se encaixar em confinamentos de terminação, pois o ciclo da compostagem acompanha o giro de 90 dias do lote. Ao final do período, o pátio já está pronto para receber uma nova carga de dejetos raspados das baias.
Lagoas de estabilização: boa alternativa para volume maior - Em propriedades médias, como as de gado leiteiro, onde os dejetos são mais líquidos, as lagoas de estabilização oferecem solução prática. Os resíduos podem ficar armazenados de 60 a 120 dias em lagoas impermeabilizadas, passando por fermentação ao longo desse período, reduzindo sua carga de contaminantes e viabilizando seu uso. O líquido tratado pode irrigar pastagens, atuando como um bom condicionador do solo, enquanto o lodo sedimentado se torna um fertilizante concentrado, o que ajuda a reduzir custos com adubação mineral.

Biodigestores: energia e biofiertilizante - Para quem deseja aproveitar ao máximo o potencial dos dejetos, os biodigestores são a tecnologia mais completa. O sistema gera biogás e produz um biofertilizante líquido, estabilizado e de grande valor agronômico.
Para dimensionar esse potencial, vamos usar um exemplo prático: um rebanho de 50 bovinos.

Com base nos dados de potenciais de produção de biogás e concentração de metano em dejetos de bovinos de corte, e considerando um sistema de biodigestão com eficiência de conversão de 37%, este rebanho teria potencial para gerar aproximadamente 28.700 kWh de eletricidade por ano. Essa energia é suficiente para suprir integralmente as demandas de 12 residências de perfil padrão ou mais de 4 casas com alto consumo de energia, incluindo ar-condicionado. Na prática, isso representa não apenas a autossuficiência energética da propriedade, mas um potencial de receita significativo.

A adoção de biodigestores é mais complexa e requer um dimensionamento adequado ao fluxo de dejetos da propriedade, exigindo um maior investimento inicial. O Departamento de Pesquisa, desenvolvimento e inovação da Premix, em parceria com a UNESP - Universidade Estadual Paulista e a USP - Universidade de São Paulo, mostrou que o uso do aditivo natural Fator P na dieta animal não comprometeu a produção de biogás. Neste caso, devido ao fato dos animais não receberem dieta composta por aditivos antibióticos e ionóforos melhoradores de desempenho, a inclusão do aditivo Fator P garantiu um biofertilizante seguro e livre de resíduos que possam influenciar negativamente a fermentação.

O Futuro da valorização dos resíduos - O aproveitamento dos dejetos vai além da energia e do fertilizante. Com sistemas mais avançados, é possível transformar ainda mais valor:
Fertilizantes organominerais: a fração sólida pode ser processada e certificada, aumentando a rentabilidade.
Biometano: o biogás, após purificado, se transforma em fonte de energia renovável, podendo ser utilizado como combustível para veículos. CO₂ verde e amônia verde: tecnologias de ponta já permitem comercializar CO₂ capturado e produzir amônia de fonte 100% renovável.

Oportunidade - O que hoje é um custo e um desafio ambiental na propriedade pode se tornar uma poderosa fonte de receita e autossuficiência. O manejo estratégico de dejetos é mais do que cumprir a lei, é uma decisão de negócio inteligente que gera ativos valiosos.Pense nisto: um rebanho de apenas 50 cabeças tem o potencial de gerar 28.700 kWh em eletricidade por ano, além de um biofertilizante de altíssima qualidade. Na prática, isso significa redução na conta de energia, substituição e redução de custo com uso de gás GLP, e  diminuição da compra de fertilizantes. O resultado é um impacto direto e positivo no fluxo financeiro, fortalecendo não apenas a sustentabilidade, mas a rentabilidade do negócio.

Ao adotar as práticas corretas,  é possível agregar valor imediato ao resíduo e amplia as margens de lucro. As oportunidades são claras:
Produção de composto mineralizado e fertilizante líquido de alto valor;
Geração de energia elétrica e térmica para a fazenda;
Mitigação de gases de efeito estufa, abrindo portas para o mercado de créditos de carbono.
O caminho começa com o apoio técnico correto, seja de órgãos de extensão ou empresas especializadas. Avalie a solução que melhor se adapta à sua realidade e comece a transformar o manejo diário de dejetos em uma oportunidade para a propriedade.


*Willian Rufino Andrade é zootecnista e Phd. em Nutrição e Produção Animal e Analista de Pesquisa, Desenvolvimento & Inovação na Premix.

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